quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Contra a interpretação (parte II)

Fig.1 - Susan Sontag
(video sobre o biografia da autora - em Espanhol: http://www.youtube.com/watch?v=jS4d1jFc7AQ)
4. Interpretação:
a. Interpretar é empobrecer, esvaziar o mundo para aparecer, ao invés, um mundo de significados – transformar o mundo nesse mundo;
b. É como que uma vingança do intelecto sobre a arte;
c. É actualmente algo asfixiante.


5. Poder da interpretação:
a. A verdadeira arte tem a capacidade de nos deixar nervosos.
b. Quando a reduzimos ao seu conteúdo e depois a interpretamos, estamos a domar a própria obra de arte;
c. A interpretação torna a arte maleável, o que se nota muito na Literatura (usa-se por exemplo a ironia, pode ser incluída numa obra por o seu autor se sentir tão pouco à vontade com o poder original da mesma.


6. Interpretar:
a. Não importa se o artista faz ou não uma obra com o intuito de esta ser interpretada ou não;
b.Há sempre em qualquer obra, sugestões de mais ou outros sentidos para além daqueles proposto pelo autor – interpretação ou várias;
c. No entanto, ao considerarmos a interpretação como sendo baseada na teoria de que a obra de arte é composta apenas por conteúdo, estamos a violar a própria arte.


7. Interpretação nas diferentes artes:
a. A maior parte da arte é compreendida devido a fugas de interpretação, que ocorrem por exemplo na pintura moderna;
b. De forma a evitar a interpretação, a arte pode tornar-se paródia, abstracta (tentativa de não haver conteúdo e sendo assim não há a possibilidade de uma interpretação), decorativa, ou não-arte;
c. Na Literatura moderna, há o uso do silêncio nos poemas que apesar de tudo conseguiu fugir às tentativas de interpretação;
d. No cinema, basta que as obras de arte tenham uma aparecia limpa e unificada, um impulso rápido e um discurso ao ponto de ser aquilo que é e não ser apoderada pelos intérpretes.
8. Criticar uma obra sem a deturpar:
a. Dar atenção à forma na arte;
b. Utilizar um vocabulário descritivo para as formas;
c. A melhor crítica é aquela que separa o conteúdo da forma, tratando cada uma à sua respectiva maneira.
9. Transparência da arte:
a. É actualmente o valor mais alto da arte e da crítica;
b. Significa luminosidade da coisa em si, ou seja, das coisas que são o que são.
c. Antigamente era criativa a obra que pudesse ser experimentada em vários níveis;
d. Actualmente é necessária a utilização dos nossos sentidos de forma a reduzir, na obra, o seu conteúdo e assim ver a coisa em si.

i. Qualquer comentário em relação à arte deve torná-la mais real aos nossos olhos. Aqui tem a critica a função de mostrar como é que é/ que é que é, e não o que significa.

10. “Em vez de uma hermenêutica, precisamos de uma erótica da arte.”

(1964)
Por Andreia Pinto

1 comentário:

  1. Soubeste expôr, de uma forma simples e sintetizada, o abrangente conteúdo do texto de Susan Sontag.
    Sontag assume neste texto uma posição firme; porém os seus fundamentos foram bastante polémicos numa época em que se começou a questionar o valor do conteúdo da Arte na sociedade contemporânea, uma vez que se deram grandes alterações nos mais diversos domínios. A autora foi de encontro às tradicionais convenções para oferecer uma nova perspectiva à leitura artística.
    Ao contrário do ideal que a herança clássica greco-latina nos deixou, Sontag nota uma necessidade, actual, de excluir o conteúdo mimético; pois qualquer conteúdo contém uma base mimética, e/ou figurativa. Mesmo quando tal não é explícito, como é o caso da Arte abstracta que se designa como uma expressão subjectiva, existe sempre a maior valorização do conteúdo do que da forma, o que favorece sempre a interpretação.
    De que modo deve ser interpretada a Arte? Aliás, deverá ser a arte interpretada de algum modo? Não, na opinião de Sontag; que salienta os défices da supremacia do conteúdo e da sua interpretação, como, por exemplo, o objectivo da Arte ser a sua compreensão, e a ideia de que a transposição de valores é uma negação mesquinha do nosso passado.
    A minha primeira opinião foi muito retrógrada, pois sobrepus logo o conteúdo à forma, porque dou um imenso mérito à hermenêutica. A interpretação é um modo de actualizar os textos antigos sem que seja necessário reescreve-los, e todo esse processo tem uma ciência impossível de se descorar.
    Esta é, e não o nego, uma intelectualização excessiva no estudo da Arte; porém, considero que, ao existir já tanta produção artística, é necessário seguirem-se determinados elementos ao se observar obras de Arte para que esta seja correctamente avaliada. Para além disso, a consciência racional existe mas não é o único componente que faz o Homem, quer queiramos ou não, o primeiro impacto que se tem no visionamento de uma obra de Arte é emocional, e só de seguida é que vem a racionalização, ou seja, a interpretação.
    Não considero a interpretação como «fugir a um passado morto», nem «impertinente, covarde, asfixiante», como refere a autora; concordo sim com o adjectivo de «reaccionária» porque é uma reacção a textos que, se não fosse a interpretação, provavelmente não eram compreendidos.
    Cada indivíduo tem uma percepção diferente da realidade, uma “interpretação” única do seu mundo, e, se pensarmos na interpretação por este caminho, existe um mundo diferente para cada pessoa. Mas o que Sontag quer ressaltar é a necessidade de transparência na Arte, valorizando a experimentação imediata em detrimento aos significados criados por cada pessoa, para que o que é Real ou até sensacional seja reerguido.
    De qualquer modo, estão aqui expostas perspectivas diferentes que, inconscientemente, desfragmentam a ideia de interpretação predefinida na sociedade em que ainda hoje estamos. É de maior importância reter a indispensabilidade da transparência na Arte, e da visão una de toda a obra de Arte, sem que se valorizem uns pontos mais do que outros.
    Após reflexões sobre este ensaio admito sofrer de conservadorismo em relação à interpretação na Arte, assim como aceito também a proposta de Susan Sontag, que clama por uma substituição da hermenêutica da Arte por uma erótica da Arte, no sentido de esta ser livre, e cada vez mais libertina.

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