quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Resumo: A voz do documentário (parte 2)

Estas foram lições que deviam ter sido melhor apreendidas pelos autores contemporâneos, mas tal, de modo geral, não aconteceu: «a entrevista ainda é um problema. […] Muitas vezes os cineastas simplesmente decidem entrevistar personagens com os quais concordam.» A pouca consciência do cineasta deturpa, de certa forma, a realidade. Também a importância que se atribui à memória histórica parece ser demasiada: «os filmes simplesmente supõem que as coisas aconteceram da forma como as testemunhas as recordam, e, para que não haja dúvidas, os cineastas respeitosamente encontram imagens ilustrativas que comprovam isso». Isto alimenta o senso comum e confunde a veracidade histórica, por exemplo: «uma testemunha menciona que aprendeu muito com os membros do Partido Comunista. Imediatamente, porém, há um corte, sem relação nenhuma, para cenas de um violento ataque aos trabalhadores. É como se a voz textual, em vez de oferecer um parecer independente, fosse tão longe a ponto de encontrar material diversionário para compensar possíveis comentários prejudiciais das próprias testemunhas!».

Estes são defeitos tornam os documentários meros «simulacros» da realidade: «não vemos uma imagem supostamente imutável e coerente, magicamente representada numa tela».

Todos estes estilos buscaram trazer a imparcialidade e a independência, mas também para mostrar o mundo nu e cru é precisa uma certa arte e delicadeza. O filme de entrevistas quis resolver as limitações de grande parte do cinema directo, já o documentário auto-reflexivo procurou assumir que as limitações de subjectividade e posicionamento social não eram problemáticos e influentes no resultado final.

A introdução de intertítulos dos documentários, além de não ser já uma medida nova (foi adoptada em filmes como Nanook), tem a particularidade de tornar a “mão” do cineasta um pouco mais invisível, apesar de ser evidente o seu cunho. É possível, através dos intertítulos, manifestar um traço de humor na abordagem do cineasta e «combater, entre outras coisas, a tentação de uma leitura ou julgamento etnocêntrico. […] Actuando de maneira auto-reflexiva, essas estratégias colocam a própria entrevista em questão e reduzem sua tática pretensão de dizer toda a verdade».

A maior parte dos documentários que hoje se produzem são na forma de entrevistas, no entanto, os recentes surgimentos de estratégias auto-reflexivas demonstram as deficiências que se evidenciam quando se transportam, ou tentam transportar, os conhecimentos da antropologia escrita para a antropologia visual.

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