quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O Evento Terrorista Bill Nichols

Moura, Dora e Labaki, Amir (orgs.), O Evento Terrorista Bill Nichols
Comentário de Deolinda Esteves, nº 33807, Línguas e Comunicação, 3º ano


É inegável que o ser humano tem uma inexplicável atracção pela desgraça alheia. As notícias que mais vendem, são aquelas que envolvem assassinatos, desastres, violência, enfim...acontecimentos que, de uma forma ou de outra, aliviam o espectador pelo simples facto de o mesmo não ser uma das vítimas. Quanto mais espectacular e catastrófica for a notícia, mais interesse parece ter. Um prazer macabro que permite a que milhares de pessoas fiquem "presas" ao pequeno ecrã para testemunharem o evento em primeira mão.
Os eventos terroristas não são excepção e um excelente exemplo é, infelizmente, o 11 de Setembro.

Deve haver muito pouca gente, no mundo, que não associe o 11 de Setembro à imagem do atentado nas torres do World Trade Center, Nova York. Apesar de existirem outros acontecimentos deveras importantes que tiveram lugar num 11 de Setembro, o 11 de Setembro será sempre associado aos EUA.
A imagem da colisão do aviões contra as torres ficou-nos gravada na memória e mesmo que, por qualquer motivo, a queiramos esquecer a comunicação social encarregar-se-á de, anualmente e pontualmente, nos avivar as lembranças.
Os orgãos de comunicação são um forte intrumento de informação mas também de manipulação e especulação. Os seus profissionais tentam, incansavelmente, captar a nossa atenção mesmo que não tenham todas as respostas para nos dar. Semeiam dúvidas, desconfianças e medos, alimentando tantas vezes histórias que nunca são totalmente esclarecidas.
Assistir, em primeira mão e em directo a um atentado terrorista é, quase sempre, uma experiência traumática e o processo posterior de recuperação depende do desenvolvimento, das respostas que forem surgindo e, da sensibilidade de quem nos informa (orgãos de comunicação social, comentadores e políticos). A necessidade de se encontrar um culpado, que vingue as mortes dos inocentes, leva a que se especule bastante, gerando um clima de desconfiança e preconceito.
O 11 de Setembro abalou o mundo, pois ninguém estava à espera de assistir à queda de um gigante chamado EUA. Por outro lado, não há nada que justifique a morte da população civil, seja em que país for.
Perante a incredulidade dos espectadores, há outro sentimento que surge na plateia - o medo -. O medo desencadeia a necessidade de se capturar e condenar alguém de forma a devolver a liberdade que fora, momentaneamente, interrompida.

Existem vários tipos de eventos:
- o modernista, que resiste às formas tradicionais da narrativa realista, onde não há lugar para a causa, a trama, sujeitos, heróis ou agentes narrativos. Dá-se mais importância ao significado do que ao facto;
- o ritual ou previsível, que como o próprio nome indica, aparenta ter causas ou origens específicas;
- o traumático, que assume uma classificação e ao qual se atribui um significado.
Pode-se dizer que o evento 11 de Setembro é uma mistura dos vários tipos de eventos uma vez que, supervalorizou-se muito o acto e focou-se bastante o presidente e a sua fantasia de viver numa América invencível e implacável, que seria vingada quando os culpados "fanáticos religiosos", fossem apanhados. Uma narrativa que se transformou num fetiche.

O fetichismo narrativo é uma forma de incapacidade, ou recusa, em lamentar a representação de eventos traumáticos. É quando se focaliza a atenção num outro lugar.
A narrativa do 11 de Setembro transformou o evento modernista num evento tradicional através de uma estratégia que não se identifica em notícias como o Holocausto. Esta estratégia minimiza o luto e maximiza a procura incessante de um triunfo justo contra o terrorismo.

A comunicação canalizou-nos (e continua a canalizar) a nós, espectadores, vítimas e cidadãos, para a procura, quase fanática, de um culpado, supostamente estrangeiro, com o nome de Osama Bin Laden e Al Qaeda. Não focalizamos tanto a nossa atenção para o luto do trauma, mas sim para o reconhecimento da soberania dos Estados Unidos e da justiça que lhe deve ser atribuida.
O mundo ficou dividido em duas partes. De um lado o Bem, representado pelos EUA e por todos os países que o apoiavam e do outro lado o Mal, representado por Bin Laden e por todos os países que não apoiavam os EUA
. A ameaça do terrorismo mudou a forma de ver o mundo e continua a estimular narrativas de causa/efeito, agente/acção. A civilização concentra a sua atenção num futuro repleto de vingança, triunfo e culto à memória. Rotula-se como sendo a imagem do Bem e nega a verdadeira essência do seu ser.



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